quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Inevitável?

Que tempo louco é esse? Eram nove horas da noite a primeira vez que te vi. O céu estava nublado, sem estrelas no céu. Em curtos intervalos de tempo, era tomado por clarões de raios que avisavam a chuva que estava perto. E já esperávamos tempestade. Num bar de Brasília, depois da seca, todo mundo comemorava a água que ia cair. E você ali com olhar novo, de quem vê tudo isso pela primeira vez.
Busquei uma cadeira na mesa vizinha, e sentei-me na ponta da mesa. Todos me cumprimentaram sorrindo. Alguns sorrisos já encharcados de cerveja. E eu com sede. O cigarro atenuava minha garganta seca. E cumprimentei a todos. Já conhecia seu nome. Alice. E lhe entreguei um sorriso e um aceno de mão. Você sorriu-me mais alto, quase um riso, e falou algumas palavras que não pude compreender naquele barulho do bar.
Passavam pessoas entregando panfletos de festas, de peças, e via você recolhendo tudo e guardando na bolsa. Um homem passava vendendo incenso. E você até deixou que uma baiana-personagem-popular pra nós brasilienses, lesse sua sorte. Eu via graça nisso tudo. Quase parecia turista de longe. Mas justamente por não parecer nada disso de fato é que você me chamava atenção. E os assuntos no bar iam mudando. Falamos de política, claro, no ano das eleições. Depois, pedimos pra você nos contar sobre seus anos na Espanha. Luísa te olhava com admiração. Eu não estava muito interessada em suas histórias. Achava interessante mesmo era sua imagem. Que da forma menos supérflua que posso dizer, mexeu comigo. Teus cabelos finos, que caiam abaixo do ombro, com leves voltas-quase-cachos e castanhos. Seus olhos arredondados, escuros e tão bem desenhados. Sua cabeça fina e seu corpo magro. Suas unhas mal-cortadas e sua sobrancelha mal-feita. Estava vestida com um moletom cinza que escondiam curvas, mas que de alguma forma parecia atenuar seu corpo. Era levemente alta e levemente desarrumada do jeito mais harmônico que já vi. E seu jeito de levantar os braços e sorrir a boca eram pra mim como um close num desses filmes que insistem em romantismo texturizado.
Foi difícil depois de tanto tempo, depois de descobrir toda minha fascinação, admitir que na verdade não dava muito ouvidos às suas palavras. Eu não me lembro bem se em algum momento racionalizei meus impulsos. Finjo até hoje que comecei a frequentar sua casa por acaso. Você também age com tudo como coisa natural. Só em seus olhos que guarda aquele brilho da novidade, da surpresa, e do mistério. Preparava-me às vezes comidas diferentes, com temperos fortes. E me fazia uma omelete de café da manhã.
Adorava sua casa com seu chão de pedra e móveis de madeira. Seu quarto que não tinha nada além de malas espalhadas no chão e sua cama, a qual ficou íntima de mim também. E passava horas lendo-me poesias e apresentando-me músicas. E passávamos horas de amor com corpo e vontade sem falta. Nossas histórias escondidas. E quando seus olhos batiam nos meus. -Que frio que me dá o encontro desse olhar...- Tinha vontade de apertar-te a mim e eternizar nossos encontros.

Mas aí vem o tempo, que já estava de novo perdendo a umidade. E naquela seca de Brasília, o tempo continuou passando. E como sempre, não conseguimos vê-lo chegar, não conseguimos vê-lo passar. Ou fomos nós que passamos por ele. Quando abrimos os olhos, ele já estava longe de nós. Não há lugar que possamos ir para nos esconder do tempo. Mesmo que suas malas estivessem ali já preparadas...
"O tempo mastiga, mastiga... E somos nós que estamos no meio de seus dentes."

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Vazios.

Chegou. Aquele momento terrível. Repetido e conhecido. Na cama, avassalador. Aos poucos, meus olhos ficavam marejados de lágrimas. E não sabia de nada. Não sabia por que chorar. Mas principalmente, não existia motivo algum para sorrir. E eu precisava sentir. Qualquer coisa, qualquer uma. E segurava minha mão em meu corpo. E aos poucos ia soltando gemidos de dor de desgosto. De tudo, com tudo, para todos. E queria largar sua mão. E todas as outras mãos que tentam encontrar a minha, no escuro. Terrível. Não via nada. E me perguntava se algum dia já havia acendido a luz.
Aqui não existem janelas. A luz do sol não bate em mim. Mas o pior é que não há brisa, não há por onde bem respirar. E meus cigarros não ajudam. Por isso gostava tanto de sua boca ao lado do meu pescoço, e seu ar novo que trazia pra cá. Mas isso é desimportante. Não sofro de amor. Sofro de vazios. E tantos. E muitos. Continuo chorando e, prestes a adormecer, lembro dos meus sonhos na noite passada. E quero ali mergulhar. Mas quero me perder por lá, também. Essa cidade não me abraça mais. Não quero fazer parte daqui. Agora não. Brasília tem essa coisa ruim de inspirar solidão. Amanhã, amanhã sempre se tem muito a fazer. Muito a entender, aprender, sei lá. Mas amanhã não quero acordar. Quero lembrar de você, da nossa viagem. Nós, na Lagoa. No natal, lembra? Espero que sim... Porque foram as melhores férias que tive. E provavelmente, nesse meu mundo dos sonhos, vou encontrar seus amigos, e sua família, e vou encontrar quem te perturba. E vou mergulhar-me na sua vida.
Não sei bem se é isso que quero, apesar de tudo. Talvez, quem sabe, seja melhor manter-me alerta. Acordada. E ficar aqui sem te ver, sem você por perto. Nem sei se existe. Mas amanhã, ah! Amanhã tenho muitas coisas a fazer. E eu sei bem como tudo acontece. Sei bem que acordarei sem querer. E fecharei os olhos, e vou te dar novo abraço. E sairei de lá com o despertador tocando pela décima e última vez. E aí fecharia os olhos de novo, e dessa vez pediria que você me abraçasse. E enquanto estou lá, esperando, vem você de verdade, me cutucando na cama. Mandando-me levantar. E eu obedeço. E você vai embora. E eu ando inconsolável... Porque nem em sonho me abraçou? E decidi aí que não vou mais dormir. Pra não ter que encarar você.
E eu achava que tinha tudo acabado, que eu já estava certa. Mas aí você chega de novo do lado da cama. Me olha com olhos sutis. E diz pra mim "Vou embora". E aí tudo gira de novo. E aí eu choro outra vez. Inconsolável, inconsolável. Foi só aí que lembrei de você. E talvez eu é que estivesse abraçando a pessoa errada. Uma espécie de você que só vive dentro de mim. E entendi que eu mesma cavava meus próprios buracos. E realidade vazia mais sono vazio, não sabia pra onde ir. E aí lembrei da Lagoa. Vou para lá. Vou caminhar pra perto do mar. E é lá que eu vou mergulhar.

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

(Asrev-eciv e) Anna ama Otto.

Siod so arap uortnocne ortnocnesed otnat euq ainomrah a rarbeuq rasuo mes, sotnuj amac an mairatied es e. Olucríc o mairarrecne e etnerf ed mairartnocne es, ía e. Onitsed omsem o arap sotsopo sohnimac. Siod so mavamlaca euq açnaruges asse are e. Olelarap radna siam atnaida oãn e solucríc soa ád es adiv a. Ragul omsem on, amrof reuqlauq ed, ranimret mai euq maidnetne e, ralucric adiv a maibecrep euqrop sotnuj rahnimac me mavapucoerp es oãn. Ortuo od ohnimac o aiuges mu, aid adac. Mavazever e. Ohnimac ortuo on mavanigami es sele, atierid a arap artuo a, adreuqse arap mu, odariv ralho ed e atrop amsem alep, maias odnauq e. Ele avasnep ale, ale avahlo ele otnauqne. Ale avasnep ele, ele avahlo ale otnauqne. Maibas es sam, mavartnocne es oãn serahlo sues. Saditrevni saroh me, ortuo oa mu saledahlo mavaçnal, oirótircse on. Otto e Anna mavahlabart, edadic ad ortnec on oicífide ednarg mu me.


Otto ama Anna.



[O amor deles é real, e bonito. Só um pouco mais difícil de acompanhar.]

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Pianoforte

Ele era um moço rico, com seus 30 anos. Formou-se em medicina como foi pedido. Casou-se com uma mulher direita como haviam encomendado. Mudou-se para a casa ao lado, que lhe fora construída. Continuava a lecionar piano por prazer. Era sua maneira de dividir seu único amor.
Seus alunos não aprendiam mais com Ele as notas musicais. Aprendiam a ver tons de cores pelo mundo através do sol. Coloriam a vida em grandes teatros com sis e mis. Eram já artistas, eram já maduros. Mas em aulas com aquele jovem doutor, sentiam inspiração, e inspiravam. Ele nunca tocou em teatro, reservando noites bem dormidas para o consultório pela manhã. Mas sabia que parte de seus fás e dós percorriam o público de seus artistas formados. Aprender música não teria um fim. E não se sabe se era aluno ou professor quem mais necessitava de tantos rés e lás.
Certo dia, um certo senhor de idade, companheiro de seu pai, bateu à sua porta. De grande família e fama dentro daquela cidadezinha de anos atrás. Sério, disse que precisava de um serviço. Queria aulas para sua filha que completava 20 anos e que mostrou súbito interesse musical depois de voltar da cidade grande. Porém, completamente inexperiente, a pequena, repetia o senhor, com grande afeição paternal. Ele já havia observado a tal menina. Passava horas na praça com outros jovens. Sorria risos largos com outras meninas aparentemente tolas. Ele não ousaria negar o pedido. Primeiramente, não se nega algo àquele senhor. E em segundo lugar, ficou curioso para entender no que aquele interesse musical consistia. Pensava que não iria longe demais. Ao menos, não tão longe quanto Ele costumava ir.
Chegou em seu primeiro dia de aula. A tal menina, batizada Emília, abriu a porta para Ele. Conduziu-o até um pequeno cômodo onde estava isolado um grande piano de cauda. Desculpou-se pela poeira. Disse que desde pequena nunca teve muito apreço pelo instrumento. Até assistir um concerto de Mozart quando foi estudar em São Paulo. Suas mãos tremiam e sua voz oscilava. Provavelmente sabia que o tal moço não costumava aceitar alunos sem preparo. Ela continuava olhando para Ele, esperando que Ele dissesse algo. Ele apenas sentou-se à beirada do piano, soprou levemente sua superfície, posicionou seus dedos sobre as notas, e começou a tocar Allegro Maestoso, em lá menor. Emília continuou de pé ao seu lado, calada. E assim foi, por mais tantas aulas. Ele chegava, tocava pedaços de Mozart, Beethoven e Bach. E ia embora.
Certo dia, Emília resolveu falar algo além do que a boa conduta pedia. Reclamou. Sentou-se em um banquinho ao lado do piano, e disse não entender como ela poderia aprender um instrumento sem nem mesmo tocá-lo. Como sua educação era tamanha, acrescentou que adorava escutá-lo tocar, mas que não era para isso que lhe haviam chamado. Ele levantou-se, e falou para que ela sentasse em seu lugar. Emília obedeceu. Ele acendeu um cigarro. Ela olhava para Ele esperando um novo comando. Ele deu uma volta na sala, aproximou-se dela por trás, e tapou seus olhos com ambas as mãos. "Se não suporta mais me ver tocar, pare de esperar qualquer coisa de mim. Vamos, esqueça o que vês. Coloca as mãos sobre o piano." E assim, vendada, seus dedos longos tocaram as teclas do instrumento. O primeiro contato. Pouco depois, Ele disse que já estava em sua hora de ir, e que só voltaria a dar aulas à jovem na semana seguinte. Enquanto isso, Ele disse, conheça-o melhor. Desligue a luz do quarto, experimente seus sons.
A semana que se passou perturbou ambos. Ele não sabia se aquilo daria certo. E Emília, obediente, só temia que estivesse fazendo algo errado. Um na mente do outro. Os dois duvidosos e incertos. Até que chegou a segunda-feira da próxima semana, e Ele voltou à casa dela. Espantado, dessa vez viu ela sorridente como quem estava ansiosa à sua chegada. Apressaram-se para o pequeno cômodo, sem dizer muitas palavras. Ela posicionou-se à frente do piano, e esboçou um conjunto de 5 notas harmonizadas, sem esperar que Ele lhe desse qualquer ordem. E assim, por muitas aulas seguintes, Ele começou a ensinar o nome de cada nota tocada, mas antes sentida.
Aos poucos, se entendiam. Nenhum deles sentia falta de verbos ou palavras completas. Às vezes, Ele lhe dava lições para cumprir. Subjetivas, como a música era, afinal. Ele levava gravações de piano de partes distantes do mundo, e passavam algumas aulas apenas apreciando-as. Aos poucos, ela já sabia esboçar Fur Elise. Aos poucos, Ele foi deixando que suas mãos tocassem as dela. Depois, já se cumprimentavam diariamente com abraços silenciosos. Deixavam os sons para as cordas percutirem.
Para o desagrado de seus antigos alunos, decidiu joga-los ao mundo. Não precisam mais de mim, repetia Ele. Mas sabia, no fundo, que era Ele quem não precisava mais daquilo. Emília tornara-se sua nova obsessão. E foi desconfiando, devagar, que encontrara um segundo amor. Em algumas aulas, ao som de Chopin, apenas sentavam-se em um sofá que acrescentaram ao quarto. E essas aulas se tornavam cada vez mais constantes. E Ele ousava sentar-se cada vez mais próximo dela.
Alimentaram-se de música e de rotina por anos. Às vezes podia-se notar o som de beijos por cima de uma obra de Debussy. Ele esquecera-se como havia se apaixonado pela música. Ela não sabia se estava apaixonada por Ele. E foi no meio de tantos esquecimentos e incertezas, que as emoções chegaram à flor da pele. Alimentadas pelo som, e demonstradas com o tato. Mas foram os olhos dele que arderam quando a avistou na praça ao lado de um outro homem. Ela parecia infeliz. O homem, contente. E Ele... Bom, Ele preferiu fechar os olhos. E não soube caminhar no dia seguinte até a casa dela.
Talvez ela já imaginasse sua ausência, pois nesse mesmo dia, bateram à sua porta e entregaram um recado em um pedaço de papel para Ele.

"Para ti, que me entregou seu amor.
Sinceramente sinto que meu pai tenha arranjado-me um casamento. Só enviarei essa carta caso você não apareça esta tarde. E se assim tiver acontecido, acredito ser melhor acabarmos com nossas aulas. Agradeço-lhe por tudo que fez por mim. Mas queria explicar-lhe que minha paixão era baseada na tua. E eu esperava que seu amor à música nunca fosse sobreposto. Sua ausência, tenha certeza, me incomoda muito no momento. Mas me incomoda mais não ter aqui comigo teu Amor Maior, teu Primeiro Amor; que eu adorava sentir. Fazia-me arrepiar os pêlos da nuca. E se agora não estás aqui, provavelmente este Amor que era seu antes de mim, já não é mais tão imenso quanto eu gostava de imaginar. Enquanto fomos capazes de compartilha-lo, tudo na minha vida era Seu Som.
Um beijo em Sol Maior.
De sua aluna, Emília."

sábado, 16 de outubro de 2010

É terno.

Amor nosso. Que aparece quando você me toca os cabelos ao ver minha nuca inclinada, pedinte. Quando eu sussurro uma palavra boba em seu ouvido, pra que fique calmo. Está ali, quando seus olhos batem nos meus. Quando te levo a conhecer aquela peça de teatro que eu tanto gosto, e fico virando minha cabeça em direção à sua só pra conferir se sorri. Quando segura minha mão e me diz pra esquecer tudo que dói. Quando nos encontramos na cama...
Que vai e passa; É terno, o nosso amor.

Salto.

Depois de perder meus limites e minhas convicções, pensei que pudesse viver encamada eternamente. Pobre de mim que perdi também as pernas e senti nos olhos uma espécie de glaucoma. A dor era incômoda, por mais que eu tivesse providenciado os mais aconchegantes lençóis e travesseiros. Eu estava parada e meu corpo queria saltar. Infelizmente, não podia avistar de longe um lugar para aterrissar.
Foi num sonho, então, que me encontrei com duas criaturinhas. Anjos que fugiram do céu, porque não aguentavam tanta tranquilidade paradisíaca. Perceberam que eu era meio como eles. Pequenina, num cenário acolhedor. Mas inquieta! Com vontade de saltar do alto. Me seguraram pela mão e me levaram pela janela. O vento frio batia por todo meu corpo. Eu voava de olhos fechados, com o corpo inerte, carregada.
Um pequeno besouro posou sobre meu rosto e puxou meus cílios para cima. Deparei-me com o sol forte batendo sobre minhas pálpebras. Virei o rosto. O dia lá embaixo estava cheio de pessoas caminhando e correndo. Algumas com mais pressa, outras apenas passeando. Não me preocupava com o motivo de qualquer uma delas agir daquele modo. Na verdade, só pensava em como é que de repente eu simplesmente deixei de fazer parte dali.
Um dos anjinhos grita pra mim "Chegou! Era aqui que você queria chegar, não é?" Eu estranhei... E o outro pôs-se a falar seguidamente "Nós escolhemos, então. É daqui, menina, é daqui que a senhorita vai saltar" E aquelas mãozinhas miúdas e juvenis me soltaram. A queda (ou o salto) teve a intensidade esquisita daquilo que é desconhecido. Uma voz vinda de não sei onde sussurrou dentro de mim "Concentre-se". Fechei os olhos. Entrei em mim mesma. Esqueci da queda e concentrei-me no salto. Assim nada de mal parecia capaz de me atingir. Mas foi quando entrei em mim, que percorri minha mente, que percebi que nenhuma resposta me era dada. Minha mente estava vazia e gritei dentro dela "É isso? É só isso que eu vim ver? O que é que você deveria realmente me mostrar?!" E a voz calma apenas disse "A resposta tá aí dentro de você, é isso que você está vendo. E uma ordem: Preencha-se".

terça-feira, 12 de outubro de 2010

Tempestiva.

Pingo por pingo, a chuva vem chegando aos seus ombros. Leve. Pingo por pingo, já saía em previsões outros mais. Outros tantos.
Ela não entendia o quê tanto lhe feria que lhe fazia chamar a chuva. Parecia uma vontade imensa de se limpar, enganada. Chuva ácida. Quando vinha, não limpava ninguém. Fazia arder os poros.

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Eu e você.

Tenho certeza que nosso ritmo criou-se da bossa nova. A sintonia quentinha que ligava seus olhos aos meus e tudo o que poderíamos ter vivido. Havia um ritmo, lembra? Um ritmo calmo que eu e você dançávamos de olhos fechados.
Perguntaram-me mais cedo "Mas e vocês, como estão?" Respondi "Vocês quem?" Olhei para o lado à procura de alguém. Até que, enfim, este terceiro sussurrou seu nome. Só ri e expliquei que não existíamos. E não é verdade? Nunca houve nós, nem vocês. Nunca aprendemos a nos juntar tanto assim. Toda a sintonia que existia era tão abstrata que inventávamos nomes mil para esconder o medo de simplesmente sermos para sempre eu e você. Eu e você, sempre precisando de uma preposição para juntarmos. Não nos misturávamos, eu e você. Só continuávamos aos encantos, aos beijos distantes e sufocantes.
Lembro que um dia, ao som de Tom Jobim, você me segurou e explicou-me baixinho que me amava. Nunca vou esquecer seu rosto naquele momento, fugitivo. E imagino que nunca tenha esquecido meu beijo em sua nuca, trêmulo. Não sei bem porquê, depois disso deitamos na cama de costas viradas. Fui buscando qualquer parte de você com minha mão esquerda, tateando seu corpo até encontrar a sua. Segurei-a forte. Sabia que você preferia não me encarar. Tentei adivinhar-te então, através daquela leve umidade que lhe invadia as palmas. E passei a amar-te de volta. Mas continuamos sem saber como virarmos uma coisa só. Ainda que quiséssemos, à cada segundo ficávamos mais distantes na cama. Sempre com as costas viradas. Você tentava se proteger de sei-lá-o-quê, e eu me contentava apertando suas mãos cada vez mais forte e sentindo seu suor frio.
Mesmo depois de tanto tempo que tombou da cama e se retirou pela porta em passos leves, ainda sinto-me apertando suas mãos. Não consigo sentir que tenha realmente partido. Talvez se eu virasse a cabeça em direção à porta, pudesse comprovar. Mas tenho medo. De perceber que fiquei eu e? Nossa história.

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Que foge com rapidez.

E essa minha sensação de que estão todos correndo? Atrás não sei do quê. De outra coisa qualquer. Do fim. De um outro início. E que metáfora é essa, a vida. Fugaz.