domingo, 28 de novembro de 2010
Aquarela
sexta-feira, 19 de novembro de 2010
13 anos.
Na porta da escola já me dizem coisas de política. Repetem o que escutam em casa, e eu quieto. Pra mim é bem mais sério pensar que o mundo vai, sim, um dia acabar. E eu nem sei o que me dá mais medo. O mundo acabar, ou saber que isso quer dizer que eu também vou desaparecer?
Alguns anos atrás, eu não entendia que as coisas se acabavam. A validade da manteiga passava e eu continuava no meu mundo imaginário dentro do meu quarto. E lá eu podia ser rei. Minhas histórias só acabavam quando eu as dava um fim. O melhor de tudo é que mesmo quando minha mãe me interrompia pra qualquer coisa chata, eu podia só continuar depois de onde eu tinha parado... Hoje em dia é difícil fazer isso. Ainda sou muito novo, mas já aprendi várias coisas da vida. Não posso jogar lixo no chão. Devo dar dois beijinhos, um em cada bochecha, para cumprimentar alguém. Tenho que ouvir o despertador.
Preciso pedir ajuda quando eu precisar. E melhor será se ela não for necessária com frequência. Pois ajudar não é uma coisa que interesse muito as outras pessoas. Mas ao mesmo tempo é terrivelmente indelicado recusar um pedido de ajuda. E a verdade é que tá todo mundo gritando por ela. Sim. Vejo na minha irmazinha, por exemplo. Ela tem 4 anos e nem sempre sabe explicar o que quer. Então ela grita e chora até que alguém consiga entendê-la. Às vezes ela joga um brinquedo no chão, cospe a comida para fora... Enfim, ela sabe pedir ajuda sem saber dizer no quê - É claro, tão pequenininha, nem sabe brincar de lego comigo, ainda - Mas o que eu já entendi é que ela não vai parar de fazer isso nunca. Até minha mãe já gritou comigo sem motivo. Ou pelo menos não deixou que eu entendesse. Fala sério e com sinceridade, mas não conseguiu me fazer enxergar o que quer; porque racionalmente pareceria tão pequeno... - Não é muito diferente do que minha irmazinha faz - Eu sei bem que todo o drama não é só pelas minhas roupas largadas na cama. Isso é só uma desculpa. Um dia cheguei irritado da escola, porque minha professora disse que meu trabalho não tinha ficado legal. Quando cheguei em casa, bati a porta do quarto, pensando só em declarar minha raiva a todos. Ninguém gostou nada disso. Mas foi só meu jeito de pedir ajuda ou colo sem ninguém que pudesse me entender.
Uma rejeição é muito difícil de superar. Tem mil maneiras e minha mãe já me disse várias. Mas ela mesma vive repetindo no intervalo de suas próprias frases “É muito difícil”. Se já é difícil pra ela, aos poucos vou perdendo as esperanças de que um dia eu vá saber como lidar. Assim, vou entendendo que essa minha solidão e minhas angústias são pra sempre. E acho que é por isso que meus vampiros imaginários não vêm mais me visitar pela mente. Eu tenho problemas maiores, agora que descobri os vilões do meu próprio mundo.
E tenho tanto medo, que é difícil dormir. Mamãe disse que não é certo ter insônia aos 13 anos - E seria “certo” ter insônia aos 30? Depois de tantos anos, aí seria normal descobrir que não se aprende nada com a vida? - Que eu sou muito novo e preciso parar de sonhar que invadem minha casa. Que eu não posso mais beber refrigerante antes de dormir. Que eu tenho que desligar a TV mais cedo. E é tão engraçado... Porque normalmente ela vem me dizer essas coisas quando por acaso ela também não consegue dormir. Dá vontade de dizer “Desculpa, mamãe, me perdoa mesmo, mas eu já conheci um pedaço triste do mundo e só falta agora aprender a mentir com um sorriso no rosto assim como o seu.”
Mas eu consigo entender. Se minha irmazinha começasse a reclamar do mundo, eu também gostaria de me imaginar capaz de ensinar feitiços que pudessem ajudar. Esperando que talvez ela tivesse mais sorte que eu.